sábado, 16 de fevereiro de 2019

III – 'Francês', o suspeito do retrato falado

1. Elivaldo Gonçalves Torres Vasconcelos – o 'Francês'
O menor Décio Luiz Venturini, afirmou ter visto o possível sequestrador de Mara Lucia, e descreveu-o, amiúde vezes à polícia ou àquele que desejasse ouvir, sem contradições de monta.  Após o encontro do cadáver de Mara Lucia solicitou-se ajuda da Polícia de São Paulo para a fotografia falada em cima das descrições da testemunha.
Concluído o retrato destacou-se como suspeito, pela semelhança insuspeita, Elivaldo Gonçalves Torres de Vasconcelos, vulgo Francês, já conhecido no meio policial.
Elivaldo, o Francês, nascido em Santa Cruz do Rio Pardo (SP), aos 24 de maio de 1942, filho de Osvaldo Torres e Vasconcelos e Elydia Gonçalves e Vasconcelos.
Tinha antecedentes criminais, conforme registros na Delegacia de Polícia do Município de Bauru:
"(...). CERTIFICA, que, em atenção à determinação do Dr. José Francisco Bastos Silva, Delegado de Polícia respectivo, e, revendo o prontuário criminal existente nesta Delegacia, encontrei o Prontuário nº 7708, referentemente ao Inquérito Policial instaurado em 28-8-1959, por infração às penas do Art. 217 do C. Penal (Sedução), constando como vítima TEREZINHA ROCHA EACHEL e como indiciado ELIVALDO GONÇALVES TORRES E VASCONCELOS. CERTIFICO MAIS, haver encontrado o Prontuário nº 8815, instaurado em 27-11-1961, inquérito policial por infração às penas do Art. 129 do C. Penal, constando como vítima HÉLIO PETERSEN e como indiciado ELIVALDO GONÇALVES TORRES E VASCONCELOS. E nada mais foi encontrado com referência ao indiciado acima citado. (...)".
O Francês respondeu por infração às penas do artigo 217 do Código Penal, por sedução, figurando como vítima uma menor, de acordo com Inquérito Policial datado de 28 de agosto de 1959, Prontuário nº 7708, Delegacia de Polícia do Município de Bauru. Também menor de 18 anos, Francês sofreu sindicância.
O segundo procedimento teria sido por lesões corporais – artigo 129 do Código Penal, instaurado aos 27 de novembro de 1961, segundo o Prontuário nº 8.815, Delegacia de Polícia do Município de Bauru, sendo o Francês condenado e beneficiado por 'sursis'.
Outras ocorrências reveladas, quatro ou mais passagens pela polícia, por brigas, embriaguez e não portar documento de identificação; sem processos. 
Mais grave, acusado de tentativa de atentado ao pudor, contra um menino, de cinco anos de idade, segundo o pai, informado pelo menor; intimado, Francês negou envolvimento e não houve processo. 
Tal comportamento, apenas na afirmação insegura da vítima, não demonstrou prática da libido descaracterizando o crime.  
Do Francês contavam mais, que era perturbado mental com fama em tarar menores, "conhecido na cidade por suas peripécias sexuais", segundo afirmações do delegado de polícia dr. Pegoraro , e teve casos abafados pelo pai, Osvaldo Torres e Vasconcelos, um empregado público dos Correios e pessoa influente junto às autoridades de Bauru, com ligações importantes nos escalões dos governos estadual e federal.
Francês, se confirmada a suspeição de seu envolvimento no 'Caso Mara Lucia', colocara-se então no ponto mais extremo do crime, ao sequestrar uma menor, depois vítima, ainda, de violência física, morta por estrangulamento e depois estuprada.
Além da representação fisionômica no retrato falado, que apontava para ele, também foi reconhecido pela testemunha, talvez não tanto convincente na opinião do delegado Pegoraro, ao apontar para o Francês, "podendo ser ele".

1.1. Um pai dominante
Osvaldo Torres e Vasconcelos nasceu em Belém, Estado do Pará, aos 23 de abril de 1912, filho do Agente dos Correios, Hildebrando Torres de Vasconcellos e Elisa Peres. 
Concluiu seus estudos na Capital e ingressou no Exército e, graduado Cabo, Osvaldo aparentemente não seguiu carreira militar, vindo para o Estado de São Paulo, visto em Bauru no ano de 1940, no quadro funcional dos Correios, com passagens, como Agente Responsável, nas localidades de Mirandópolis, Lins, Santa Cruz do Rio Pardo, Cafelândia, Pirajuí e, finalmente, Bauru desde 1955 até sua aposentadoria em 1970. 
Bastante conhecido em Bauru e região, Osvaldo gostava de escrever versos, alguns publicados em jornais; foi casado com Elydia Gonçalves com quem teve três filhos, sendo conhecidos no Inquérito Policial 10/71, Elivaldo e Telma.
Com o 'Caso Mara Lucia', apontando o envolvimento do seu filho Elivaldo, requereu aposentadoria em 1970/1971 e mudou-se com a família para Rio Claro, onde faleceu aos 17 de setembro de 1988, aos 76 anos de idade . 
Osvaldo, empregado dos Correios, nos anos de 1940 seria complementar da rede de informantes da 'Polícia Política de Getúlio Vargas', pela 'Delegacia Especial de Segurança Política e Social – DESPS', acompanhando as atividades políticas e sociais dos cidadãos nos locais onde residia, suspeitos ou não, com quem os tais se encontravam ou reuniam, além do absoluto controle das correspondências, de quem escrevia e a quem destinava, assim como dos conteúdos dessas missivas, cujos resultados entregues aos agentes do governo central.
Agiu desta maneira em Santa Cruz do Rio Pardo, na qual residiu no início dos anos de 1940 e, certamente, noutras localidades por onde passou, inclusive Bauru. Em Cafelândia fez parte do Diretório do Partido Trabalhista Brasileiro – PTB . 
Osvaldo manteve iguais procedimentos, no período do Governo Militar instalado em 1964, até o ano 1970, aposentado em 1971, quando se mudou para Rio Claro-SP. 
A ditadura militar de 1964 valera-se dos muitos informantes do Governo Vargas e da estrutura de repressão dos estados, à base de colaboradores lotados no serviço público federal, ou nele infiltrados. Nada oficial, não se tem registros documentados, porém inegavelmente Osvaldo, funcionário dos Correios, usufruía influências úteis para acudir e livrar o filho Elivaldo dos incidentes sexuais e de outros constantes envolvimentos com a polícia.
2. Reconhecimento visual – semelhante ao retrato falado
Décio, sob rígido controle policial e testemunhas qualificadas, aos 19 de novembro de 1970, instado a reconhecer o suspeito, entre demais pessoas mais ou menos semelhantes e colocadas numa sala da Delegacia de Polícia do 2º Distrito Policial de Bauru, apontou o Francês, "podendo ser ele", como o que mais se assemelhava ao acompanhante de Mara Lucia. 
À frente dos trabalhos estava o delegado Luiz Pegoraro, e serviram de testemunhas no reconhecimento, Roberto Midena, residente e domiciliado à Rua Carlos Marques, 5-40, e Álvaro Pires Camargo, morador à Rua Alto Juruá, 3-56, ambos endereços no Jardim Bela Vista, Bauru. 
No ato Décio, embora menor de idade, diante de possível pressão familiar em contrário e outros desafios, apresentava aparente compreensão dos fatos, tanto que apontou o Francês, e nenhum outro, como aquele que mais se aproximava dos traços fisionômicos da pessoa, por ele vista, junto de Mara Lucia. 
Ainda assim, o delegado Pegoraro considerou que o púbere não foi suficientemente seguro no reconhecimento para continuidade das investigações, mostrando-se aquela autoridade satisfeita com os álibis apresentados pelo Francês, que pouco depois já não residia em Bauru.
Quando Décio não reconhecia suspeitos estes eram dispensados, contudo o delegado não tomou providências contra o Francês que, além de ser o mais parecido de todos com o retrato falado, também foi o único reconhecido visualmente pela testemunha, como aquele visto com Mara Lucia. 
Outras evidências que poderiam incriminar o Francês, foram desprezadas por Pegoraro, a exemplo, que Mara Lucia não seguiria uma pessoa estranha, tranquilamente pelas ruas da cidade, nem entraria num lugar diferente sem esboçar resistências; então, ela conhecia o sequestrador, e, desta maneira, quem entrou com ela naquela casa, dali saiu sozinho, sem ser notado.
Mara Lucia sabia quem era a pessoa ao seu lado, por isso despreocupada, e a única testemunha apontava exatamente para o Francês, que a conhecia há cerca de cinco anos, desde quando vizinhos, sendo ele afamado tarador de menores de idade, casos não ignorados pela polícia, no entanto desapoiados pelas autoridades, e até aventou-se ordem superior para que a polícia não o enquadrasse culpado.
A ditadura militar, instituída em 1964, raramente influía no rumo das investigações de crimes comuns, mesmo os hediondos, pelas delegacias de polícia dos municípios, exceto naqueles casos que pudessem afetar interesses ou segurança de algum dos seus membros ou informantes. 
Ao leigo, também elementar que a escolha daquela casa não acontecera ao acaso; quem optara pelo local para a prática assassina sabia, antecipadamente, tratar-se de um imóvel desocupado e colocado à venda, além de previamente ciente que naquele dia outras pessoas estiveram no local, para serviços ou visitas, de modo que sua entrada no imóvel, acompanhado por alguma jovem, ainda que menor, passaria desapercebida, podendo tratar-se de pessoas interessadas na compra do imóvel. 
O descritor do retrato falado jamais afirmou, ao gosto das autoridades, que reconhecia no Francês o homem que acompanhava Mara Lucia, na última vez que ela vista com vida, apenas como aquele que mais se aproximava, ou seja, "podendo ser ele", à mesma maneira que nunca apontou nenhum outro suspeito como o possível acompanhante da menina, isto por mais parecido que fosse com o Francês ou com o retrato falado. Décio somente viria saber quem era o Francês, após o reconhecimento. 
Mesmo quarenta e seis anos depois, numa entrevista dada à TVTem de Bauru, afiliada da Rede Globo, ao ar em 15 de novembro de 2016, Décio recordou, outra vez, o derradeiro encontro com Mara Lucia, indicando, sem citar qualquer nome, quem era o acompanhante: "Conheci uma pessoa e ela é essa pessoa que conheci e era amigo dela [Mara Lucia], conhecia ela, morou vizinho lá no Alto da Cidade"; e isto, outra vez, remeteu ao Francês.
Quando descartado o Francês, estranhamente os investigadores expandiram suas atividades com interrogatórios e informações junto aos vizinhos e pessoas que poderiam ter visto alguém, cujas características fisionômicas pudessem ser próximas ao retrato falado, descrito por Décio Luiz Venturini, porém nenhum suspeito teve o seu reconhecimento.
Afora aqueles cujos traços próximos do retrato falado, a polícia também pesquisou alguns nomes vinculados à família da vítima, e os praticantes de crimes assemelhados, presos em algum município após o ocorrido em Bauru, admitindo-se possibilidades de assassino em série.

3. Quando o Francês na mira dos policiais
Duas equipes policiais, uma sob o comando do delegado de polícia, José Geraldo Cremonesi, e outra pelo homólogo Luiz Pegoraro, ambas em algumas diligências conjuntas onde investigado o suspeito Francês apresentaram relatórios independentes sobre o caso, o dr. Cremonesi aos 23 de novembro e assinado em 03 de dezembro de 1970, e o dr. Pegoraro aos 28 de novembro de 1970, com fatos posteriores acrescidos sem adendos. 
Os relatórios, foram firmados após Francês ser reconhecido por Décio, "podendo ser ele", aos 19 de novembro de 1970, quando o suspeito teria prestado declaração extraoficial à polícia, depois oficializada e datada em 18 de dezembro de 1970. 
Não fosse assim, difícil entender a presciência dos delegados de polícia daquilo que viria dizer o Francês.

4. O depoimento do Francês
Elivaldo Gonçalves Torres e Vasconcelos, o Francês, oficialmente compareceu à Delegacia de Polícia do Município de Bauru aos 18 de dezembro de 1970, para declarações acerca do 'Caso Mara Lucia', na presença do delegado titular, José Francisco Bastos Silva.
Pela data e conteúdo do depoimento, 18 de dezembro de 1970, é certo que Francês fora ouvido em data anterior a 23 de novembro do mesmo ano, quando se sabe que, pelo menos, o relatório assinado pelo dr. Luiz Pegoraro, em 28 de novembro, antecipa os principais pontos do que falaria o Francês, ao descrever os álibis apresentados colocando-o ausente do local e proximidades onde ocorrido o crime, consoante testemunhas que somente depois seriam ouvidas.  
Seja como for, assim declarou o Francês: 
-"(...) que o declarante reside nesta cidade [Bauru], há 16 anos; -que, atualmente trabalha por conta própria, de empreita, na feitura de instalações elétricas; que, o declarante, em 1958 ou 1959, sofreu uma sindicância, quando contava 17 anos de idade, pelo delito de sedução praticado contra Terezinha Rocha Eachel; -que esse crime quando praticou, digo, que o defloramento da menor ocorreu no meio do mato; que, é certo que o declarante no caso supra narrado, alegou que não conseguira completar a conjunção carnal, porque estava muito nervoso; -que, trabalha desde 16 anos de idade, em eletricidade, consertos de aparelhos, tendo trabalhado na Companhia Telefônica Brasileira [CTB], [no] Departamento dos Correios e Telégrafos, [e] como contratado, na Utilar; que, trabalhou nos Correios e Telégrafos em 1964 e 1965, como baldeador de malas; que, retifica para dizer que trabalhava como servente, no tráfego postal; -que, é certo que no serviço, o declarante, lidava com cordas que vinham amarrados os pacotes de jornais; que, as cordas que o declarante via, nos, digo, lidava nos Correios e Telégrafos não se assemelhavam com a que ora é exibida ao declarante; -que, é certo que as cordas depois de cortadas iam para o lixo; -que, é esclarecer, que as cordas dos Correios são lisas; -que, o declarante conhecia há dois anos aproximadamente a família de Mara Lucia Vieira, sua mãe, seu pai sua irmã mais velha; que, conhecia a vítima pelo nome de 'Lucia'; -que, residiu próximo da casa dos pais da vítima, à Rua Virgílio Malta, nesta cidade, sendo que João Vieira e a família residiam nos fundos; que, residiram perto em 1960, durante aproximadamente um ano; -que, depois que a família de João Vieira que mudou do local, quando iam visitar os avós a filha mais velha costumava brincar com a irmã do declarante, sendo que Mara Lucia às vezes ia chamá-la na casa do declarante;  -que, o declarante nunca brincou com Mara Lucia e sua irmã; que, não é certo que tenha contado piadas ou historinhas à irmã da vítima ou à sua própria irmã; que, ignorava que tivesse fama popular de não ser 'muito bom da cabeça'; -que, é certo que o declarante é nervoso mas não perde o raciocínio; que, conhecia a vítima Mara Lucia, de vista; -que, é certo que trabalhou com um empreiteiro de nome Felisberto, e quando fazia serviço para a Cia. Telefônica Brasileira, na Vila Cardia, é certo que crianças lhe deram água, mas, não sabe quem são essas crianças; -que, não sabia que João Vieira havia se mudado para a Vila Cardia; que, não é certo que Maria Angélica ou Mara Lucia tenha dado água ao declarante, quando trabalhavam no serviço já mencionado; -que, tal fato deve se ter dado em outubro do ano passado, ou melhor dizendo, de janeiro à outubro, não se recordando o mês que, desconhece que tivesse fama de 'tarado'; -que, quando tinha 13 anos de idade aproximadamente, ou 14 anos, foi operado de fimose, e residia à Rua Maria José, não sendo então vizinho da família de João Vieira; -que, não tem certeza que quando foi operado se residia na Rua Maria José ou na Rua Domiciano Silva; -que, quando tinha 18 anos foi indiciado em inquérito policial, sendo denunciado por 'Lesões Corporais' contra a vítima Hélio 'Carteiro' [Hélio Petersen]; -que, o fato se deu por estar o declarante brincando com uma amiga sua no bar, a quem já conhecia, sendo condenado e beneficiado por 'sursis', não se recordando por quanto tempo; -que, teve mais 4 ou 5 passagens pela polícia por briga, embriaguez ou falta de documentos, sem processo; -que, foi acusado pelo pai de um menor ter puxado o calção do mesmo, no Bar do Takeo, ao que parece na época em que estava sendo processado; -que, quer esclarecer que não teve qualquer culpa nesta ocorrência; que, foi intimado, mas não houve processo; -que, não pode precisar a idade, mas o referido menor deveria contar aproximadamente 5 anos; -que, referido menor foi quem acusou o declarante de ter puxado o seu calção, sendo que o pai do menor, 'disse que o declarante queria tarar menor'; -que, ignorava que João Vieira residia à Rua Benjamin Constant, tomando conhecimento de tal fato no dia 12, quinta-feira noite (12-11-1970); -que, ficou sabendo do rapto da menor Mara Lucia, na manhã do dia 12-11-1970, pelo noticiário do jornal da cidade; -que, o Jornal da Cidade noticiou o fato como desaparecimento num pequeno trecho; que, no dia 11 de novembro, o declarante almoçou por volta das 12,30 horas, lembrando-se disso porque estava ouvindo notícias numa rádio de Bauru; -que, quer esclarecer que não gosta de tomar conhecimentos de notícias à respeito de crimes;  -que, no dia 11 de novembro, saiu de casa por volta das 13,10 horas, trajando uma camiseta marrom e uma calça azul; -que, usava cinta e camisa de mangas curtas, não tendo relógio no pulso, e sapatos marrons; -que, nunca usou cordel ou corda no lugar da cinta; que, ainda no mesmo dia, trajava a camisa para fora; -que, nesse dia, estava sem bigodes e barba feita; -que, dirigiu-se até a Industria Eletrônica 2001, onde chegou por volta das 13,20 horas à procura de emprego, não conversando com ninguém; -que, referida Eletrônica fica na esquina da Rua Padre João com Rua Gustavo Maciel; -que, viu sair do local um sargento da Aeronáutica, porém, também não conversou com ele, e é seu conhecido; -que, dali dirigiu-se até a rua 15 de Novembro onde conversou com uma mulher a quem perguntou a respeito de um salão para, digo, salão que pretendia alugar para trabalhar, sendo que o referido salão que dista duas quadras aproximadamente da Rua Araujo Leite, já havia sido alugado, que, tal fato se deu por volta das 13,30 horas; -que, dali desceu à rua Antonio Alves, Cussy Junior indo até à Av. Rodrigues Alves, passando pela Araujo Leite; que, na Av. Rodrigues Alves dirigiu-se a Eletro Técnica para procurar serviços e como o responsável ali não estivesse, voltou um pouco até um funileiro com quem esteve conversando até às 16,00 horas, que, não conhecia o referido funileiro; -que, o referido funileiro é 'japonês'; que, dali foi até uma travessa da Av. Rodrigues Alves, num laticínio, dali voltando pela Av. Rodrigues Alves, digo, pela Rua Marcondes Salgado até a esquina com Rua Araujo Leite, onde encontrou-se com um colega seu de nome Felix que reside na rua Saint Martin esquina com a Rua Capitão Gomes Duarte, com quem conversou durante uns vinte minutos, indo para o Banco Itaú América onde chegou por volta das 17,10 horas mais ou menos; -que, ali descontou um cheque de Cr$ 3,00 saindo daquele Estabelecimento por volta das 17,35 horas; que, voltou à sua casa de ônibus para 'Altos da cidade'; -que, chegou á sua casa por volta das 18,00 horas; que, ali esteve, digo, que ali não encontrou ninguém, tendo entrado mas não tomou banho nem trocou de roupa; -que, a mãe do declarante chegou 10 a 15 minutos depois, e como o pai tivesse comprado uma bicicleta nova para sua irmã procedeu alguns reparos de ajustes na mesma, e após jantar saiu por volta das 20,20 horas; -que, foi então ao SESC estudar, dali saindo por volta das 22,00 horas; que, voltou para casa com um colega cujo nome não sabe e se recolheu para dormir por volta das 22,30 horas; -que, o declarante se lembra de ter perguntado à este seu colega se tinha ouvido falar à respeito do rapto, ou tinha ouvido alguma notícia; -que, quer retificar que não comentou com o colega à respeito do rapto; que, esclarece ainda que naquela quarta-feira não tinha ouvido falar nada a respeito do rapto; -que, não participou das buscas para localização da menor raptada; que, no dia 12, quinta-feira, à noite, esteve na Rua Saint Martin, esquina com a Rua Benjamin Constant, onde residia a vítima e ali ficou sabendo que a menor raptada era filha de João Vieira; -que, ali cumprimentou e conversou com João Vieira; que, ali conversou também com um advogado que defendera João Vieira num caso de Estelionato; que, conversou com algumas crianças sobre 'regra de três'; que, conversou ainda com duas moças, uma delas 'mulata'; -que, não é certo que tenha feito qualquer proposta à moça que tinha no local; -que, no dia 13 esteve novamente no local, de manhã, por volta das 11,00 horas e à noite por volta das 20,45 horas; -que, não ouviu alguém dizer que 'o criminoso talvez estivesse entre os presentes'; -que, viu no local um rapaz que é conhecido pela alcunha de – 'Gordo' e que reside numa 'republica' na rua Saint Martin esquina com Rua Rodrigo Romero; -que, quer retificar que o local acima referido é 'republica', digo, que o local acima o declarante ignorava se era 'republica'; -que, é certo que na segunda-feira, no dia 9 de novembro teve uma discussão com os sócios proprietários da Eletro Técnica do Lar à rua Rodrigo Romero, esquina com Rua Saint Martin; -que não é certo que o declarante tenha chamado o referido 'Gordo' de 'veado'; -que, sábado esteve na Vila Falcão num barbeiro onde cortou o cabelo, e ali comentou com o referido barbeiro que no caso de localizar o raptor deveria o mesmo ser colocado num manicômio e não linchado como o povo queria fazer; -que, no dia 15, após o encontro do cadáver o declarante esteve nas proximidades do local, não tendo porém entrado casa; -que, faz muito tempo que não passa pela Rua José Ranieri, a não ser em companhia de um colega seu Miguel Dias Sanches, de camionete; -que, se lembra que na rua Saint Martin, próximo à rua Benjamin Constant havia sacos de cimento que, digo, e pedreiros trabalhando, isso na sexta-feira dia 13; -que, se inscreveu no Instituto de Educação Ernesto Monte, em agosto último, para fazer exame de madureza; -que, é certo que estudava sozinho preparando-se para madureza, ou com o seu pai, e que, uma das propagandas das quais pegou folheto foi do curso de madureza 'Gino Crês'; -que, conhece uma loirinha, uma tal de 'Bira', com quem já conversou na 'Loja do Lar'; -que, não foi ao enterro e nem à missa de 7º dia da vítima; -que, acha que no local do crime o local onde deve estar a impressão digital é na bacia na privada, por se tratar de material não poroso; que, acha que a porta do local do crime não se prestaria à recolher impressões digitais, pelo que já leu à respeito em livros; -que, no arco de cabelo de plástico, pode ficar impressão digital; que, se fosse o autor do crime faria ampla confissão; -que, está disposto à submeter a exame no Polígrafo em São Paulo, de sua livre e espontânea vontade, a fim de provar que não é o autor do delito e que foi vítima Mara Lucia Vieira; -que, é certo que fazia entrega de bujão de gás e usava cordas para amarra-los; -que, usava cordas grossas para efetuar as entregas; que, já foi carteiro; que, o pai do declarante já trabalhou nos Correios e Telégrafos nesta cidade. -(...)."
O álibi do Francês mostrou-se extremante acurado em cada detalhe; um 'jogador' que se expõe e brinca com a polícia e orienta a mesma como melhor investigar, onde recolher impressões digitais, e se mostra disposto submeter-se ao 'detector de mentiras' – o polígrafo, talvez por saber o funcionamento do aparelho e como usar contramedidas para se livrar dela, ou, no caso de revés, a lhe restar a alternativa de ser internado num hospital especializado. 

4.1. O que sugerem as divergências de datas
A Portaria para Instauração de Inquérito, datada de 08 de dezembro de 1970 e recebeu o número 10/1971, ou seja, oficializada no início do ano seguinte, quando já avançadas algumas linhas de investigação. 
Tudo certo, nenhum problema, que o Inquérito Policial traga, em seu bojo processual, o número 10/1971, mas causa estranheza nenhuma referência à data de 08 de dezembro de 1970. Por certo, excessiva burocracia.
Cumpre ressaltar, uma vez mais, que o depoimento do Francês ocorreu aos 18 de dezembro de 1970, ou seja, em data posterior aos relatórios assinados pelos dois chefes de equipes de investigações, o dr. José Geraldo Cremonesi, entre 23 de novembro e 03 de dezembro de 1970, e dr. Luiz Pegoraro, aos 28 de novembro de 1970.
O relatório assinado pelo dr. Pegoraro, no entanto, traz detalhes dos álibis e testemunhos que seriam apontados pelo Francês apenas vinte dias depois, com intrigantes coincidências, como se o depoente tivesse com antecipação estudado as descrições detalhadas pelo citado delegado.   
As diferenças de datas entre o relatório e os depoimentos das testemunhas são, ainda, maiores, porém, incrivelmente quase iguais, à exceção de uma única, conforme adiante postas.
Óbvio que o Francês poderia ter sido ouvido antes, em 19 de novembro de 1970, quando submetido ao reconhecimento pela única testemunha, e depois as suas declarações transcritas em 18 de dezembro, com data atualizada, mas não as declarações das testemunhas.
Nestes termos cabem questionamentos se o implicado e suas testemunhas seguiram ou não um roteiro padrão, pré-elaborado pela própria polícia, para livrar o Francês do rol dos suspeitos. 
Mais crível, porém, que todo levantamento policial, firmado na Portaria de 08 de dezembro de 1970, foi refeito para dar lugar a expedientes maquiados e inseridos no Inquérito Policial então instituído pela Portaria de nº 10/1971.

5. Depoimentos que mencionam o Francês
A investigação policial, oficialmente a partir da abertura de Inquérito, teve por objeto levantar elementos de materialidade e autoria de conduta criminosa, através de provas desde o momento pericial e daí a campo colhendo testemunhos, ouvindo informantes, pesquisando suspeitos e cometedores de crimes análogos, para assentar, com justa causa, a instauração de ação penal, a partir da autorização judicial.  
Todos os detalhes são fundamentais numa investigação policial, inclusive os relatos de família, em especial quando se tem algum suspeito a ela relacionado ou dela conhecido. Os progenitores de Mara Lucia, alguns dos parentes e os mais próximos foram convidados para declarações junto às autoridades, a fim que pudessem recordar e descrever as possíveis ligações da vítima e dos pais com algum suspeito.

5.1. De Leda Grossi Vieira, a mãe da vítima

Leda Grossi, brasileira, branca, do lar, nascida em Bauru (SP) aos 19 de julho de 1940, filha de José Grossi e Felicidade Teixeira Grossi, casada com João Vieira em 10 de outubro de 1959, domiciliada e residente à Rua Saint Martim nº 14-5, esquina com a Rua Benjamin Constant, Bauru, prestou declarações junto à Delegacia de Polícia do Município, na presença do delegado dr. Oswaldo Sena, aos 05 de janeiro de 1971 .
Na oportunidade Leda descreveu com detalhes o último dia de vida da filha Mara Lucia, tudo corriqueiro até o momento quando, já aflita, procurou pela menina e teve um encontro com o menor Décio Luiz Venturini, que lhe dissera ter visto a menina e descrever o homem que caminhava, aparentemente tranquilo, ao lado dela.
Quando ouvida na Delegacia de Polícia, Leda sabia que Elivaldo Gonçalves Torres e Vasconcelos, o Francês, estava entre os suspeitos de matar sua filha, e respondeu que o conhecia, que ele morava com os pais e, por algum tempo, foram vizinhos, os quintais fazendo fundos, e suas filhas sempre iam brincar com a irmã dele, por nome Telma. 
No ano de 1965 a família de Leda mudou-se para a Vila Cardia, e apenas a mãe a residir próxima do Francês, nos altos da cidade. Nas costumeiras visitas à genitora, Leda levava as crianças, sendo que as filhas Maria Angélica e Mara Lucia iam na casa dos pais do Francês para as brincadeiras com a coleguinha. 
Houve um tempo, Leda se lembra, por aproximadamente quatro meses deixou de visitar a mãe, porém, uma semana antes da morte de Mara Lucia, ela, o marido e as crianças foram até lá, ocasião em que viram o Francês e este os viu, no entanto, sem trocas de cumprimentos. 
Sem revelar acontecimentos familiares que justificassem o distanciamento de quatro meses, Leda também não esclareceu por qual razão ela, o seu marido e o Francês não se cumprimentaram, e nem disse se naquele dia suas filhas foram ou não brincar com Telma, a irmã do rapaz. 
Leda não informou e nem foi questionada sobre possível desentendimento entre a família Vieira e o Francês, que tinha e ela sabia, a fama de tarar menores, e este, em seu depoimento, enfatizara nunca 'ter brincado' com a Mara Lucia ou com a sua irmã.
O que significava um adulto, sobejamente conhecido por tarar menores, brincar com uma menina? Ainda, o Francês dissera que não era certo ter contado piadas ou historinhas à irmã da vítima ou à sua própria irmã; que ele desconhecia sua fama de 'tarado', e que aos 13 ou 14 anos 'teve cirurgia de fimose'. A primeira resposta, é certo, que obtida por inquirição, mas o declarar-se postectomizado não parece pertinente, exceto alguém ter observado, se possível, e denunciado tal detalhe.
Em continuidade, Leda informou que no ano de 1968 sua família ainda residia na Vila Cardia, à Rua Rio Grande do Norte, 4-65, quando a Cia. Paulista de Força e Luz estava substituindo os postes, e entre os trabalhadores estava o Francês. 
Leda recordou que certa feita, alguns daqueles empregados da Companhia pediram água em sua casa, sendo servidos por Mara Lucia que lhes trouxe um garrafão, e todos se serviram, inclusive o Francês. Solicitaram mais água e desta feita sua outra filha, Maria Angélica, apanhou o garrafão vazio para de novo enchê-lo e trazer aos homens, e teria sido a Maria Angélica quem reparara o Francês entre os trabalhadores: "olha lá quem está trabalhando lá, o irmão de Telma." 
Naquela oportunidade, segundo Leda, o Francês não conversou com suas filhas, as quais já aconselhadas que não brincassem perto dele, 'que ele não era muito certo do juízo'.  
Leda também disse que o Francês não chegava perto de suas filhas quando elas brincavam com Telma, e elas diziam que o rapaz não se aproximava delas quando brincavam, nem lhes falava nada. 
Não perguntado e nem informado, o que todos sabiam ou ouviam dizer, sobre as relações fora do casamento mantidas entre Leda e o Paulo Marques, do qual nascido Mara Lucia.

5.2. Do João Vieira, o pai da vitima 
João Vieira, 33 anos, branco, nascido em Bauru-SP, aos 04 de abril de 1937, filho de Pacífico Vieira e dona Carolina Davy Vieira, casado com Leda Grossi Vieira aos 10 de outubro de 1959, domiciliado e residente à Rua Saint Martin nº 14-5, em Bauru, à época dos fatos . 
O Vieira trabalhava como 'Representante Comercial e Viajante' na firma Aliança Mercantil Ltda, filial de Bauru (SP) situada à Rua Azarias Leite nº 3-36. 
Informou à polícia que, na época dos acontecimentos, estava em viagem desde o dia 10 de novembro, a serviço, e somente no dia 12 do mesmo mês, em Ourinhos, soube do desaparecimento da filha e, de imediato, retornou a Bauru. 
As declarações de Vieira praticamente confirmaram tudo quanto dissera sua esposa Leda; ele conhecia o Francês, foram vizinhos, e um mês antes do desparecimento da filha, num domingo, viu o mesmo defronte sua casa, e não se interessou pela sua presença. Dias depois, com a família, em visita à sogra, viu o Francês junto ao portão onde residia, mas não se cumprimentaram . 
Também o Vieira não explicou a razão da mútua antipatia com o Francês, embora este, quando do seu depoimento, lembrou que João Vieira tivera problemas com a lei, por estelionato.
João Vieira metera-se em dificuldades financeiras, envolvido em crime de estelionato, a necessitar de urgente socorro em dinheiro, que sua mulher Leda soube onde e como conseguir, junto ao Paulo Marques, seu amásio. Verdade ou mentiras, os comentos foram reais.
5.3. Da Jane Grossi Marques da Silva – tia de Mara Lucia
Jane Grossi Marques da Silva, nascida em Bauru (SP) aos 24 de setembro de 1944, filha de José Grossi e dona Felicidade Teixeira Grossi, casada com o policial militar José Marques da Silva, prestou depoimento a 02 de janeiro de 1972, na Delegacia Seccional de Polícia de Bauru, onde presente a autoridade policial, dr. José Geraldo Cremonesi.
Em seu depoimento Jane confirmou que deixara sua filha de três meses com a irmã Leda Grossi Vieira, naquele 11 de novembro, para alguns ajustes no centro da cidade, detalhando o horário da mamadeira da criança, às 17,00 horas, inclusive esclarecendo o seu retorno iniciado, por volta das 16,30 horas, até a casa da irmã.
No caminho, Jane viu o Francês, de passagem, descendo a rua Saint Martin mais ou menos na altura da Rua André Padilha entre as 16,40 e 17,000 horas. Já conhecia o Francês, mas não o cumprimentou e nem lhe prestou muito atenção, no entanto pareceu-lhe que o rapaz usava camisa branca de mangas curtas, e não sabe qual a direção por ele tomada após o casual cruzamento. 
Mulher de policial, Jane sabia da fama do Francês e que ele 'não era muito certo da cabeça', mas naquele dia que o viu não reparou nele qualquer esquisitice. Também a mãe de Jane morava vizinha da família do Francês. 
A polícia não perguntou nem Jane respondeu se havia algum problema entre o Francês e pessoas de sua família.

6. Um depoimento até para ser desconsiderado
José Nelson Venturini, 23 anos de idade, brasileiro, solteiro, cobrador, nascido aos 02 de julho de 1947, em Bauru, filho de Alcides Venturini e Tereza Pratiani Venturini, residente e domiciliado à Rua Olavo Bilac, 3-42, Jardim Bela Vista, compareceu na Delegacia de Polícia do Município, aos 17 de junho de 1971, para prestar declarações, estando presente o delegado José Geraldo Cremonesi.
Primo do menor Décio, José Nelson conhecia do Francês desde a idade de seis anos, quando residiram vizinhos; e teriam se encontrado na data do sumiço de Mara Lucia, nas proximidades da casa dos Vieira.
Na ocasião, segundo o declarante, Francês procurou conversa, dizendo que a desaparecida Mara Lucia não se encontrava distante tanto quanto as equipes de buscas estavam procurando, e que Décio reconheceria a pessoa que caminhava com a menina, no dia do seu desparecimento.
O depoente fantasiou que o Francês lhe teria dito: "a polícia devia procurar pelos títulos de eleitores, que seria mais fácil de descobrir [pois] quem não votou, seria o cara que a polícia estava procurando."
Um despropósito. Na ocasião do encontro entre o José Nelson e o Francês, numa sexta-feira, 13 de novembro, ainda não ocorrera as eleições, portanto, o Francês não pronunciaria semelhante absurdo.
Se tal observação poderia ou não anular depoimento, compete a destacar que José Nelson impressionara-se com tais revelações do Francês, e percebera que este tinha arranhões no rosto, lado direito, e sua barba parecia recentemente escanhoada.
Ainda, segundo José Nelson, Francês se mostrava nervoso, falando, saindo e retornando, inquieto, para retomar conversa, atraindo sobre si suspeita de culpa no desaparecimento, até então assim sabido, da menina, porém não o denunciou às autoridades por não ter provas, e seria palavra contra palavra, caso aquele viesse contraditar.
O depoente considerava o Francês tipo esquisito, e naquela oportunidade apenas o ouviu, sem nada responder nem perguntar, optando em permanecer calado para evitar aborrecimentos e discussões com alguém que se mostrava preocupado e gaguejante.
José Nelson se retirou por volta das 17,10 horas, para cumprir serviço; que depois encontrou-se com a namorada e revelou tudo o que Francês lhe havia dito, acreditando que o mesmo estaria envolvido no caso.
O depoente encerrou esclarecimentos afirmando que não procurou pelo tio Décio, na casa deste, para não prejudicar qualquer ação do parente ou de quem lá com ele estivesse, contudo o fez no dia seguinte, e se prontificou a colaborar na elucidação dos fatos relacionados com o inquérito policial.

7. Das testemunhas citadas pelo Francês
O Francês apresentara álibis sobre o seu dia 11 de novembro de 1970, em Bauru, citando os diversos lugares onde e com quem esteve. Aparentemente excessivo histórico, nos mínimos detalhes.
Conseguiu convencer o chefe de equipe de investigações, o delegado dr. Luiz Pegoraro, de quão robusto o seu álibi.

7.1. O Félix Sanches Filho – um testemunho destoante
Félix, solteiro, 33 anos de idade, nascido em Bauru aos 20 de setembro de 1939, filho de Félix Sanches e Encarnação Gomes Sanches, morador à Rua Saint Martin, 8-20, prestou depoimento na Delegacia de Polícia do Município, em 11 de janeiro de 1971, perante o delegado dr. Oswaldo Sena, posto citado no álibi apresentado por Francês, que ambos se encontraram no dia 11 de novembro de 1970, na esquina das ruas Marcondes Salgado com a Araujo Leite, numa conversa aproximada de vinte minutos.
O depoente confirmou conhecer o Francês cerca de três anos antes, inclusive trabalharam juntos há mais de seis meses, porém, negou o encontro, revelando que em 18 de dezembro de 1970, por volta das 18,00 horas, quando se encontrava próximo de um bar, na esquina das ruas Joaquim da Silva Marta com a Virgilio Malta, apresentou-se-lhe a mãe do Francês, chamando-o pelo nome para, em particular, instruí-lo confirmar à polícia, caso fosse ouvido, que o seu filho havia trabalhado com ele até as 16,00 horas do dia 11 de novembro de 1970, ou seja, na pressuposta hora do sumiço de Mara Lucia. 
Félix considerou absurda a proposta, e ignorando a razão pela qual a mulher o procurasse para dizer à polícia algo que não acontecera. 
Quanto a conduta do Francês, nos tempos que trabalharam juntos, nada percebera de anormal, nada sabendo que o desabonasse .
O depoimento de Félix não teve a acolhida merecida por parte das autoridades. A dar crédito à informação de Félix, a família do Francês, à época, corria contra o tempo para acertar um álibi perfeito. 

7.2. Depoimento de Mituo Harada 
Mituo Harada, com idade 47 anos, funileiro, nascido em Hiyogo-Ken, Japão, aos 06 de maio de 1924, filho de Tunesaburo Harada e Tami Harada, residente à Avenida Rodrigues Alves, 14-83, aos 21 de dezembro de 1971 prestou depoimento na Delegacia de Polícia do Município, estando presente o dr. Cremonesi.
O funileiro Mituo, segundo o seu depoimento, não conhecia o Francês antes de 11 de novembro de 1970, quando o atestou em sua oficina por volta das 15,30 horas, e lá permanecera cerca de meia hora, em conversa mais amiúde com José Leôncio, vizinho de Mituo.
O depoente lembrou que o Francês lhe dissera entender de consertos de geladeiras; aparentava ser pessoa normal, sem se lembrar dos trajes e se estava ou não com barba ou bigode. 
Também informou que foi procurado por policiais, em especial, o delegado Pegoraro, ao qual prestou informações verbais.
Finalizou dizendo não se recordar que tivesse informado, a pedido, as horas ao Francês, se cinco para as quatro horas ou quinze e cinquenta e cinco horas, pois na sua funilaria existe relógio de parede visível a todos no ambiente . 
Em contraposição o relatório assinado pelo dr. Pegoraro, traz inconteste que "O proprietário dessa oficina confirmou que 'Francês' esteve conversando consigo as 15,55 horas do dia 11 de novembro. Tal precisão de horário, dada por Mituo se deve a uma indagação de que horas eram, feita por 'Francês', naquela ocasião".

7.3.  Depoimento de José Leôncio 
José Leôncio de Macedo, 75 anos, aposentado e vendedor de bilhetes de loterias, nascido a 19 de março de 1896, natural de Picuí (PB), filho de Manoel Salustiano de Macedo e dona Hermila Farias de Macedo, residente em Bauru à Avenida Rodrigues Alves, 14-85, fundos, prestou depoimento aos 21 de dezembro de 1971, na Delegacia de Polícia do Município, presente o delegado Cremonesi.
O idoso não conhecia o Francês em data anterior ao 11 de novembro de 1970, confirmando encontro entre ambos naquele dia, por volta das 15,30 e 16,00 horas, próximo ao portão da Funilaria do Harada, quando abordado por aquele que desejava alugar uma garagem ao lado. Na ocasião teria informado que a tal garagem já estava alugada e não sabia de outra qualquer para locação nas proximidades.
O depoente observou que o Francês, vestia camisa 'parda' ou marrom, sem se lembrar a cor da calça. Pode precisar o horário em esteve com o Francês, entre as 15,30 e 16,00 horas, por se encontrar no portão de sua casa no horário de seu jantar, costumeiramente nesse horário, e o tempo da conversa transcorreu em dez minutos, e não se recorda ter dito o horário para o Francês; também não soube informar se aquele estava ou não de bigode, todavia pode perceber que o tal olhava muito para a Avenida 'Marginal' e insistia que por ali era ponto comercial ideal para suas pretensões.
José Leôncio de Macedo, procurado por policiais logo após descoberta do corpo de Mara Lucia, reconheceu o Francês tanto pela fotografia apresentada, quanto pessoalmente quando o mesmo trazido pela polícia . 
A polícia investigava o Francês buscando por informações, através de fotos, de quem poderia tê-lo visto, e depois apresentava o mesmo a tais pessoas, em vez de intima-las para comparecerem à Delegacia, e lá o reconhecimento em meio a outros indivíduos. 

8. Uma investigação despropositada
Os investigadores da capital, Luiz Olivares, Nelson da Cunha Paes Leme, e Bernardo Espin Garcia, em serviços auxiliares no 'Caso Mara Lucia', recomendaram aos delegados de polícia, averiguações pormenorizadas sobre o folheto do Curso de Madureza, encontrado sob o corpo da vítima . 
Tal sugestão, foi seguida à risca e exageradamente pelo dr. Cremonesi, chefe de uma das equipes de investigação policial de Bauru, que aos 21 de julho de 1971 determinou diligências sobre distribuições de folhetos do Curso de Madureza 'Gino Crês' detalhando: a data da impressão; quantidade distribuída; forma da distribuição; e se o Francês esteve matriculado no referido Curso , e, em caso confirmado, a data de sua inscrição; além de colher informações junto às pessoas que trabalharam na residência, antes do acontecimento, se lá se encontrava algum folheto do referido curso . 
No verso do documento oficial, consta resposta das investigações – datada de 25 de agosto de 1971, que os folhetos foram impressos em torno de 40 dias antes do crime cometido, sendo distribuídos 40 mil folhetos, pela Polícia Mirim de Bauru, de casa em casa; que Elivaldo Gonçalves Torres de Vasconcelos, o Francês, não esteve matriculado no Curso 'Gino Crês', portanto, não houve qualquer data de matrícula. O pessoal responsável pela limpeza e dedetização do imóvel não encontrara nenhum folheto do Curso 'Gino Crês'. Assinou a resposta o João Bastos Pereira Neto, investigador de polícia .
A determinação da autoridade policial, no caso, parece sem nexo. Em documento de fls. 40-verso datado de 18 de dezembro de 1970, o investigado Francês já havia dado esclarecimentos que se inscrevera no Instituto de Educação 'Ernesto Monte', no mês de agosto de 1970, para prestar exame de Madureza, que estudara sozinho ou com o pai, e que "uma das propagandas das quais pegou folheto, foi o Curso de Madureza Gino Crês."  
Da mesma maneira, os responsáveis pela dedetização do imóvel já haviam prestado depoimentos em 24 e 25 de agosto de 1971, e informaram que não existia folheto algum de Curso de Madureza. 
 A despeito de tais informações, em 08 de setembro de 1971, o delegado ainda insistiu no caso dos folhetos, junto à Polícia Mirim, solicitando "apurar, através dos policiais mirins que teriam distribuído os folhetos na Rua Prof. José Ranieri, em novembro de 1970, se jogaram nas sacadas, se adentraram nas residências ou quintais, se entregaram em mãos e, se foi fiscalizada essas entregas, e por quem foi fiscalizada " e tal diligência ao encargo do investigador de polícia João Bastos Pereira Neto . 
Em 12 de outubro de 1971, esclarecido que muitos daqueles policiais mirins envolvidos nas distribuições de folhetos (ano de 1970), já haviam deixado a legião e, se efetivamente necessária a relação nominal, tal se daria por ofício. Os mirins não apenas jogaram folhetos nas sacadas e quintais, também entregaram em mãos, e a fiscalização foi realizada pela Escola, mas não rua a rua . 

9. A Imprensa no acosso ao Francês
De certa forma o regime militar que governou o Brasil, período 1964/1985, não se metia em assuntos de crimes comuns, sendo estes de competência exclusiva dos estados, através das suas delegacias de polícia instaladas nas capitais e nos municípios, embora houvesse restrições às liberdades e das garantias constitucionais, promovidas por estes aparelhos, a mando ou solicitação do DOPS, Órgão do Executivo, como atos de prevenção e repressão dos delitos de ordem política e social, não excluídos os crimes comuns, sobre os quais influenciava de maneira a impedir que algum seu informante, ou colaborador, fosse privado de regalias, privilégios e facilidades para se livrar de certas investigações desconfortáveis, ou contar com justiça parcial inclinada ao favorecimento e interesses do sistema.
A favor dos seus o governo criava embaraços às divulgações pela imprensa, coibida inclusive de reportar quadros de violências e corrupções, pois em tudo os órgãos de repressão viam tentativas progressivas, de grupos procurando denegrir e atingir a honra dos amigos da revolução e daqueles outros, sempre dispostos no combate à subversão, associando-os a escândalos locais e crimes comuns.
A mídia, ainda que controlada e às vezes vetada, noticiava os crimes comuns, que não enquadrados nos assuntos proibidos pelo regime, como as contestações ao governo ditatorial, agitações políticas e estudantis, e as infrações distinguidas pela Lei de Segurança Nacional. 
Então havia noticiário de crimes comuns, com certo sensacionalismo para aqueles de mão própria, sem coautoria, considerados violentos de natureza grave contra a pessoa e, de certa forma, os repórteres investigativos até colaboravam com as investigações policiais, muitas vezes, chegando antes aos autores de grandes crimes. 
Um ano depois, as duas principais equipes de investigações divergiam-se quanto a autoria do sequestro, estupro e assassinato da menina Mara Lucia. 
Para o dr. José Geraldo Cremonesi, as investigações em torno do Francês deveriam prosseguir, enquanto para o dr. Luiz Pegoraro os álibis apresentados o eximiam de qualquer suspeição.

9.1. O repórter investigativo Saulo Gomes
No impasse investigativo quanto ao suspeito Francês ser ou não o autor do crime, o repórter investigativo Saulo Gomes, da 'Emissoras Associadas', chegava a Bauru precedido da fama de resolvedor de casos policiais complicados ou aqueles deixados a desejar pelas autoridades perante a opinião pública.
O jornalista Saulo, com informações privilegiadas que o Francês se mudara de Bauru para Rio Claro (SP), com os pais e a irmã menor desde outubro de 1971, armou esquema de reportagem anunciando revelar o autor do bárbaro crime, mediante entrevistas gravadas, em imagem e som, com testemunha ocular e o próprio implicado, a causar forte impacto na sociedade bauruense, surpreendendo inclusive as autoridades. 
No programa radiofônico 'Paredão' – líder em audiência, levado ao ar em 17 de dezembro de 1971 pela então Bauru Rádio Clube, prefixo PRG-8, o repórter declarou que tinha provas que o Francês, era o autor dos crimes cometidos contra Mara Lucia. 
A credibilidade daquele jornalista dispensou apresentações das provas que ele dizia possuir, e o programa de audiência maior gerou impacto na população, com clamor nacional após sua exibição pelo Canal 4 de Televisão – TV Tupi, em 'vídeo-tape', na noite de 17 de dezembro de 1971. 
Conforme dito em ambas as reportagens, também a polícia de Bauru sabia que o Francês era o culpado, e quem era a tal testemunha que o repórter preservara ao não divulgar o nome e endereço.
-"Eu fui a Bauru para cobrir um assassinato e cumpri minha missão. Poderia ser qualquer outro repórter de minha emissora. O caso já estava encerrado pela autoridade policial e só divulguei as informações que me foram passadas pelo delegado da época ." 
A polícia civil de Bauru não deteve o repórter Saulo Gomes, antes aceitou seu compromisso em comparecer, voluntariamente, à delegacia para prestar depoimento no dia seguinte à reportagem, o que não aconteceu. O repórter teria telefonado de São Manoel (SP), quando em trânsito para a cidade de São Paulo, e, também, não atenderia convocação para o dia 20 de dezembro de 1971. 
À autoridade policial restou solicitar junto ao Departamento Especializado de Ordem Política e Social – DEOPS, São Paulo, ouvir o repórter e apreender as provas que ele dizia possuir contra o Francês.  

9.2. E o Francês prestou queixas 
Elivaldo Gonçalves Torres de Vasconcelos compareceu à Delegacia de Polícia de Rio Claro, aos 18 de dezembro de 1971 para registrar, perante a autoridade policial, dr. Breno de Freitas Guimarães Junior, as ações contra ele cometidas pelo repórter Saulo Gomes.  
"(...): que há cerca de um mês e meio atrás o declarante mudou-se com seus pais e sua irmã menor da cidade de Bauru, para a esta cidade de Rio Claro; que, o motivo de tal mudança prendeu-se ao fato de o proprietário da casa em que o declarante morava na cidade de Bauru tê-la pedido para reforma; que, além de tal motivo a família do declarante pretendia morar mais perto de São Paulo, por ser uma região de mais recursos; que, o declarante a partir do dia 10 do corrente mês começou a trabalhar na Cerâmica Rocha desta cidade, como forneiro; que, no dia [de] ontem, por volta das 13,30 horas, estava o declarante trabalhando, quando foi chamado pelo Encarregado da Fábrica, para acompanhar ao escritório a fim de tratar de alguns documentos; que, a entrar no escritório o declarante deparou com várias pessoas que lhe eram desconhecidas, duas das quais empunhavam holofotes acesos; que, no mesmo instante um homem que se encontrava no escritório apresentou uma fotografia de uma garota que havia sido assassinada na cidade de Bauru, no ano passado perguntando-lhe se o declarante conhecia a mesma; que, o declarante lhe respondeu que sim, dizendo que a intensa cobertura jornalística que havia sido feita durante o fato, com constantes publicações da fotografia da garota, bem como o fato de algum tempo atrás a família da garota ter residido próximo a casa do declarante em Bauru, faziam com que este se recordasse da mesma; que, em seguida o referido homem que o declarante posteriormente ficou sabendo tratar-se do repórter Saulo Gomes, passou a lhe dizer que o mesmo era considerado como principal suspeito da autoria do referido crime; que, o declarante protestou por sua inocência dizendo que inclusive já havia prestado declarações sobre o fato na Delegacia de Polícia de Bauru e que tais declarações haviam sido prestadas em virtude do declarante ter residido algum tempo perto da residência da vítima; que, o declarante acrescentou ainda que na ocasião em que prestou declarações várias outras pessoas também haviam sido detidas e prestado declarações na Delegacia de Bauru; que, o repórter então lhe disse que estava de posse de uma atestado médico passado pelo Doutor Fauzer Banuth do qual constava que o declarante sofria das faculdades mentais; que, o repórter em seguida lhe mostrou um atestado, assinado pelo referido médico, mas que o declarante não se recorda se no referido atestado estava constando seu nome; que, o repórter a seguir lhe disse que poderia arrumar-lhe uma internação para tratamento do mesmo, ao que o declarante respondeu que não necessitava de tal tratamento uma vez que é perfeitamente normal; que, o declarante esclarece que realmente há alguns anos atrás fez um tratamento com referido médico, ou melhor dizendo, consultou-se com referido médico, pois andava um tanto nervoso, mas que entretanto seu contato com o mesmo somente se resumiu nessa consulta; que, o repórter ainda lhe mostrou um folheto relativo a um curso de madureza existente na cidade de Bauru que teria sido encontrado ao lado do corpo da vítima, ao que o declarante respondeu que nada sabia sobre o mesmo, uma vez que nada tinha a haver com referido crime; que, o declarante neste ato esclarece que no ano passado realmente fez um curso de madureza no SENAC, mas que o referido folheto era de uma escola chamada ‘GINO CRÊS’ da cidade de Bauru, escola essa que o declarante somente conhecia de nome; que, toda a conversa entre o repórter e o declarante foi filmada e gravada pelo primeiro; que, no final disse que iria comunicar a entrevista à Delegacia de Polícia de Bauru e de Rio Claro; que, o repórter ainda lhe mostrou uma cordinha dizendo que era semelhante a que havia sido utilizada pelo indivíduo que matou a menina e perguntou-lhe se [a] cordinha original lhe havia sido mostrada na Delegacia de Polícia de Bauru, ao que o declarante respondeu negativamente; que, o repórter ainda disse ao declarante que seu advogado de Bauru, já havia sido avisado da entrevista, devendo chegar nesta cidade de Rio Claro, por volta das 17,30 horas; que, em seguida foram desligados os holofotes e o repórter com dois acompanhantes retirou-se do escritório; que, em seguida o declarante foi chamado pelo seu patrão que dizendo que em virtude da situação criada, o declarante não mais poderia continuar a prestar serviços na Cerâmica, dispensando-o portanto do trabalho, após o pagamento dos dias em que efetivamente trabalhou; que, em seguida o declarante retornou a sua casa sendo que a noite seus pais viram pela televisão uma reportagem dizendo que o declarante estava sendo considerado como principal suspeito da autoria do crime e que se encontrava sendo submetido a intenso interrogatório; que, o declarante esclarece ainda que [o] repórter lhe contou que o mesmo havia sido seguido desde sua casa até ao local dos trabalhos, pela equipe de reportagem; que, contudo o declarante se de fato foi seguido não se apercebeu disso. (...)."  
A reportagem foi arrebatadora. 

9.3. Delegado do SOPS de Bauru recorreu ao DEOPS
O delegado de polícia, dr. José Geraldo Cremonesi, chefe do Serviço de Ordem Política e Social – SOPS de Bauru, ao se ver frustrado com a promessa de comparecimento do repórter Saulo Gomes junto àquele órgão de polícia para os esclarecimentos e apresentações de provas quanto a reportagem, encaminhou ao DOPS, de São Paulo, o Ofício nº 191/12/71, datado de 20 dezembro de 1971.
Segundo o delegado Cremonesi, o repórter policial Saulo Gomes declarou no programa radiofônico intitulado 'Paredão', pela Bauru Rádio Clube – PRG 8, que Elivaldo Gonçalves Torres de Vasconcelos era autor dos crimes de sequestro, estupro e morte da menor Mara Lucia, alegando ter, mas sem apresentar, o nome e endereço de uma testemunha ocular, gravado em tape. A Polícia de Bauru tinha em mãos cópia gravada do programa 'Paredão' de 17 de dezembro de 1970.
O tema foi apresentado pela TV Tupi, Canal 4, da Capital, na mesma data, e, na seguinte, noticiado na imprensa escrita. 
O feito do repórter Saulo, conforme o dr. Cremonesi, causou estardalhaços, com telefonemas constantes e pedidos de entrevistas, atrapalhando e, de certa forma, anulando as investigações em andamento e parceria com a Delegacia de Polícia do Município de Rio Claro, cidade onde o suspeito passara a residir.
O repórter, na versão do delegado, embora comprometido não compareceu à Delegacia de Bauru, em data de 18 de dezembro de 1971, às 9,00 horas, para prestar depoimento, alegando compromisso já anteriormente assumido, depois, na data de 20 dos mesmos mês e ano, às 13, 00 horas, sem qualquer satisfação.
Para o delegado a única testemunha ocular era o menor Décio Luiz Venturini, inquirido por diversas vezes e, outras tantas, chamado para o reconhecimento de suspeitos, sem resultados conclusivos. Dr. Cremonesi abraçava, agora, o parecer do dr. Pegoraro quanto aos reconhecimentos de Décio, especialmente em relação ao Francês, nada ou não tão concludentes. 
O delegado oficiante temia, pelo menos assim disse, que a revelação do paradeiro de Francês pudesse motivar represálias, por parte dos parentes da vítima, face a comoção social havida após a reportagem. 
A polícia de Bauru, pelo SOPS, requereu do DEOPS a localização de Saulo Gomes, para que este informasse o nome e endereço da testemunha por ele avocada, e a apreensão do tape das entrevistas com a referida e o incriminado; além de outras informações de interesse policial .

9.4. As declarações do jornalista Saulo Gomes
Saulo Gomes, jornalista, 43 anos de idade, branco, casado, filho de Oscar Gomes e Iara Santos Teixeira, natural de Guanabara (RJ), morador à Rua Nova York, 28, apartamento 42, Bairro Sumaré, São Paulo (Capital). 
Localizado e intimado a pedido da Delegacia de Polícia de Bauru, prestou declarações no Departamento Estadual da Ordem Política e Social, DEOPS de São Paulo, na presença do delegado dr. Haroldo Ferreira, a 27 de dezembro de 1971.
Saulo Gomes declarou que efetivamente fizera um programa de entrevista na Bauru Rádio Clube sobre o sequestro, estupro e morte da menor Mara Lucia, crimes ocorridos no dia 11 de novembro de 1970, e que na ocasião afirmou possuir provas que o autor do crime era Elivaldo Gonçalves Torres de Vasconcelos, vulgo Francês, então domiciliado e residente à Avenida 4 A, nº 127, em Rio Claro (SP), e teria preservado a identidade da testemunha para evitar riscos de represálias, todavia a tratar-se de Décio Luiz Venturini, então menor de idade – 14 anos em 1971, amigo e vizinho da vítima, o qual inclusive já ouvido na Polícia.
Nas suas declarações Saulo informou que o entrevistado Décio reconhecia o Francês como aquele que efetivamente estava junto com Mara Lucia, por tê-lo visto sob ângulos diversos, como de frente, de lado e de costas, conforme consta em entrevista com o menor, registrada numa gravação em seu poder, única fonte, comprometendo-se entrega-la à autoridade, o que efetivamente cumprido na mesma data . 
Não perguntado, também Saulo Gomes não se referiu a entrevista feita e filmada com o Francês em Rio Claro, apresentada pela TV Tupi – canal 4, sem dúvidas o 'tape' requisitado pela polícia junto a emissora.  
De posse das declarações do repórter Saulo Gomes, o delegado Cremonesi, em 20 de janeiro de 1972, comunicou ao juízo de direito da comarca de Bauru:   
"MM. Juiz,Continuamos diligenciando na árdua tarefa de chegarmos ao autor do bárbaro crime narrados nestes autos.As precipitadas, inoportunas e indébitas declarações do repórter Saulo Gomes dificultaram investigações que se procediam aqui e em Rio Claro. Daí as providências de fls. 209 e 219. Vê-se pelas declarações de fls. 218, tomadas pelo DEOPS na Capital do Estado, que o repórter nenhum fato novo trouxe à prova, e que a testemunha referida já fora ouvida às fls. 14, além de um reconhecimento também não concludente (fls. 152). Novamente inquirido por nós, extra-autos, após a entrevista do repórter, o menor informante, manteve a mesma dúvida, não alterando, em nada, suas declarações anteriores. Assim, s.m.j., a entrevista não passou de sensacionalismo barato sem qualquer indício suficiente de matéria, que nos levasse a outras medidas legais. Continuamos a trabalhar com persistência, investigando essa e outras denúncias paralelas que têm chegado ao nosso conhecimento e com possíveis ligações com os fatos criminosos. Para tanto, solicitamos com a devida vênia, a colaboração e compreensão de DD. Juízo, concedendo-nos dilação de prazo por mais trinta dias.(...) ". 
O jornalista jamais revelou o nome da fonte de sua informação.
Até o arquivamento do Inquérito Policial 10/71, em 14 de setembro de 1974, nenhuma outra referência a Elivaldo Gonçalves Torres de Vasconcelos, vulgo Francês, como suspeito dos crimes cometidos contra Mara Lucia.